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Parte I: OS PRINCÍPIOS
Parte I: OS PRINCÍPIOS

1. Visão Panorâmica do Mapeamento Espiritual

Em dezembro de 1992, encontrei um marco pes­soal significativo — o vigésimo aniversário de meu envolvimento com missões nas fronteiras. Tal como se dá com todos os eventos delineadores, a ocasião foi motivo de cele­bração e reflexão. Foi um tempo de regozijo devido à fidelidade de Deus, embora também um ensejo para contemplarmos o quão radi­calmente o mundo e os campos missionários mudaram durante as duas últimas incríveis décadas.

A Igreja está enfrentando, no momento, dois desa­fios externos substanciais, que tentam embargar a sua contínua expansão: "o entrincheiramento de­moníaco" e "o adiantado da hora".

O progresso do evangelismo, desde os começos da década de 1970 até hoje, tem sido simplesmente espantoso. Em adição aos gran­de movimentos de Deus na Argentina, na Rússia, na Indonésia, na Guatemala, no Brasil, na Nigéria, na Índia, na China, na Coréia do Sul e nas ilhas Filipinas, também têm ocorrido desenvolvimentos notáveis em lugares tão inesperados como o Afeganistão, o Nepal, o Irã, a Mongólia e a Arábia Saudita. A implantação bem-sucedida de igrejas nas ilhas do oceano Pacífico, na África e na América Latina tem reduzido o território-alvo do esforço evangelístico mais concen­trado a uma tira de território que vai dos 10 aos 40 graus de latitude norte, e que percorre o Norte da África e a Ásia, conhecido como "a Janela 10/40".

UMA VIAGEM POR CEM NAÇÕES

Nestes últimos vinte anos, tive o privilégio de contemplar grande parte desse processo evangelístico sobre uma base pessoal e in loco. 

Papéis de liderança em várias missões e movimentos têm-me propor­cionado a oportunidade de viajar e ministrar em quase cem nações do mundo — uma jornada que me tem levado a centros de detenção da KGB russa, às inseguras e sangrentas ruas de Beirute e aos mostei­ros infestados de demônios do Himalaia.

Essa íntima e tão ampla jornada também me tem levado a con­cluir que o progresso da evangelização, nas últimas décadas, dificil­mente prosseguirá em ritmo igual nas próximas décadas a menos que os crentes familiarizem-se melhor com os princípios da guerra espiritual. Pois se a tarefa restante de evangelização mundial have­rá de diminuir quanto à área (pelo menos no que tange a territórios e estatísticas sobre grupos étnicos), também tornar-se-á um desafio cada vez mais intenso. Nos últimos poucos anos, os intercessores e os evangelistas que procuram trabalhar dentro da janela da região de 10/40 graus de latitude norte têm-se encontrado face a face com algumas das mais formidáveis fortalezas espirituais da terra.

A Igreja está enfrentando, no momento, dois desafios externos substanciais, que tentam embargar a sua contínua expansão: "o entrincheiramento demoníaco" e "o adiantado da hora".

Embora dificilmente seja sem igual o entrincheiramento dos de­mônios — pois os hebreus encontraram o fenômeno tanto no Egito quanto na Babilônia, ao passo que o apóstolo Paulo encontrou-o em Éfeso — precisamos considerar que agora estamos vários séculos mais avançados na história do que eles. Em alguns lugares do mundo atual, notavelmente na Ásia, os pactos demoníacos têm sido servidos continuamente desde os dias pós-diluvianos, e a luz espiritual é ali quase imperceptível em nossa própria época.

Em adição a isso, também devemos considerar a hora em que estamos vivendo. No livro de Apocalipse, Deus advertiu como segue os habitantes da terra e do mar: "Ai dos que habitam na terra e no mar; porque o Diabo desceu a vós, e tem grande ira, sabendo que já tem pouco tempo" (Ap 12.12). Relatos reiterados e crescentes de incursões do evangelho em suas fortalezas, erodidas pela oração, têm feito o inimigo perceber que a hora que ele vinha temendo há muito está chegando sobre ele. Evidências a esse respeito são providas na crescente incidência de sinais e prodígios demoníacos, além de con­tra-ataques cada vez mais constantes contra aqueles que estão ten­tando sondar ou escapar de seu covil.

Em suma, os guerreiros evangélicos, no fim do século XX, podem esperar enfrentar desafios, no campo de batalha espiritual, que não têm 

igual quanto ao tipo e à magnitude. Os métodos comuns de discernimento e de resposta a esses desafios não conseguirão mais resolver o problema. Conforme escrevi no meu livro recente, The Last of the Giants (Chosen Books), se tivermos de vencer com sucesso as obras do inimigo, "Temos de aprender a ver o mundo confor­me ele realmente é, e não como parece ser".

DEFINIÇÕES E PRESSUPOSTOS

Em 1990, cunhei uma nova expressão para essa nova maneira de ver as coisas — "mapeamento espiritual" — que agora é o tema central deste volume. Conforme sugeri, isso envolve "superpor a nos­sa compreensão acerca das forças e eventos, no domínio espiritual, sobre lugares e circunstâncias deste mundo material".1

O pressuposto-chave quanto a isso é que aqueles que põem em prática o mapeamento espiritual já possuem uma fina compreensão sobre o domínio espiritual. Dada a quantidade de tempo que muitos crentes passam falando, cantando e lendo sobre essa dimensão sobre a qual a realidade estaria arraigada, parece que esse deveria ser um pressuposto razoável. Infelizmente, não é isso que acontece. E isso constitui para nós uma profunda surpresa.

Poder-se-ia pensar que os caminhos da dimensão espiritual são tão familiares para o crente médio como o mar é familiar para os marinheiros; que a maioria dos crentes deveria conhecer, na teoria e na prática, aquilo de que Paulo estava falando no sexto capítulo da epístola aos Efésios, quando ele escreveu sobre uma batalha que está sendo desfechada contra as hostes espirituais da iniqüidade, nos luga­res celestiais.

O problema parece ser que muitos crentes — sobretudo em nosso atarefado hemisfério Ocidental — não têm dedicado o tempo necessá­rio para aprenderem a linguagem, os princípios e os protocolos da di­mensão espiritual. Alguns crentes preferem ignorar tudo, exceto as suas características macrocósmicas (o céu, o inferno, Deus e o diabo), ao passo que outros tendem por projetar características extraídas de sua própria imaginação. Ambas essas tendências constituem erros sérios. Enquanto que a primeira delas ignora o que está ali, a segunda fica ofuscada por aquilo que não está ali. Em ambos os casos, as obras do diabo permanecem disfarçadas, e o reino das trevas vai florescendo

O mapeamento espiritual é um meio através do qual podemos ver o que está abaixo da superfície do mundo material; mas não é um meio mágico. Trata-se de um meio subjetivo, porquanto é uma habili­dade nascida de uma correta relação com Deus e do amor ao mundo que ele criou. E trata-se também de um meio objetivo, pois pode ser confirmado (ou desacreditado) por meio da história, da observação sociológica e da Palavra de Deus.

Por igual modo, o mapeamento espiritual não se confina exclu­sivamente às obras das trevas. Alguns crentes que praticam a guer­ra espiritual têm dado a essa disciplina uma definição mais estrita — que a limita ao descobrimento das fortalezas demoníacas — embora isso envolva algum perigo. Mais especificamente, ela pode encora­jar uma preocupação com a localização e as atividades do inimigo, ao mesmo tempo que se ignora que Deus também opera na dimen­são espiritual. Quando superpomos a nossa compreensão acerca das forças e eventos que ocorrem no domínio espiritual, para luga­res e circunstâncias deste mundo material, devemos lembrar que essas forças e esses eventos não são todos negros. O mapeamento espiritual simplesmente situa as obras do inimigo dentro do contexto maior da dimensão espiritual.

O CAMPO DE BATALHA ESPIRITUAL DE HOJE

A Igreja de Jesus Cristo não deve retroceder diante da necessi­dade de dar uma longa e atenta olhada para os obstáculos espirituais que estão entre ela mesma e o cumprimento da Grande Comissão. O campo de batalha espiritual da década de 1990 está-se tornando cada vez mais um lugar sobrenatural. Existem crentes cuja teologia pessoal mostra-se resistente a essa noção, mas esses crentes, com freqüên­cia, são teóricos ocidentais que não são pessoas viajadas, que ainda precisam submeter os seus pressupostos ao teste da realidade. Em contraste com isso, a vasta maioria dos pastores, missionários, evangelistas e intercessores internacionais de hoje não têm qualquer necessidade de serem convencidos de que existe algo em algum lugar, e que esse "algo" se está manifestando em nosso mundo material.

Mas o que, exatamente, essas pessoas estão podendo observar? Com base nas respostas obtidas de volta, da parte de crentes interes­sados ao redor do mundo, eis três observações primárias:

1. As trevas espirituais estão aumentando e tornando-se mais so­fisticadas.

2. Há certo padrão geográfico do mal e da opressão espiritual.

3. Os crentes não entendem a dimensão espiritual tão bem quanto imaginavam.

  As igrejas locais estão descobrindo que a demografia do cresci­mento eclesiástico não nos diz tudo sobre as nossas comunidades. As agências missionárias estão percebendo que uma bem informada familiaridade com costumes transculturais não consegue efetuar irrompimentos evangelísticos. E as instituições de oração intercessória estão reconhecendo a necessidade de buscarmos coordenadas mais precisas para os nossos alvos. Em suma, as pessoas querem respos­tas para o dilema do mundo invisível, a fim de que possam ministrar o evangelho de maneira mais eficiente.

FORTALEZAS TERRITORIAIS

Aninhado perto do âmago da filosofia do mapeamento espiritual está o conceito das fortalezas territoriais. Não se trata de alguma idéia nova; muitos escritores já tinham explorado esse tema. A novi­dade está na crescente porcentagem do Corpo místico de Cristo que reconhece a necessidade de atacar essas fortalezas.

O problema é que a expressão "fortalezas territoriais" tem sido explorada ultimamente de maneira tão frouxa que precisamos defini-la. Seu uso tem-se tornado tão elástico que aqueles que se estão apro­ximando do assunto dificilmente podem decidir no que devem crer.

Em meio à confusão, alguns autores evangélicos têm sugerido que qualquer noção de guerra espiritual que envolva a idéia de territorialidade espiritual é extrabíblica. Outros têm lançado um véu de dúvidas sobre a validade da própria guerra espiritual. Embora es­sas vozes estejam claramente na minoria, é evidente que precisamos definir esses conceitos com maior exatidão.

Aqueles que não estão aceitando a idéia de territorialidade espiri­tual através do argumento que se trata de uma noção extrabíblica deveriam lembrar que há um oceano de diferença entre aquilo que é "extrabíblico" e aquilo que é "antibíblico". Extrabíblico é uma luz ama­relada que encoraja a passagem de um veículo com uma certa caute­la; antibíblico é uma luz vermelha que requer que o motorista faça alto, em nome da lei e do bom 

senso. Até o momento, não ouvi ainda alguém afirmar que a territorialidade espiritual é antibíblica. E a sim­ples razão para isso é que isso não é verdade.

Peter Wagner e outros têm salientado, em escritos anteriores, que a Bíblia toca no assunto da territorialidade espiritual em ambos os Tes­tamentos. 2 A instância mais constantemente citada é a do príncipe da Pérsia, no décimo capítulo do livro de Daniel. Temos ali um caso bem-definido de um ser espiritual maligno que governava uma área com fronteiras explicitamente determinadas. Até mesmo aqueles que não são eruditos devem considerar como significativo que essa criatura não foi referida como príncipe da China ou príncipe do Egito. Quando essa passagem é estudada conjuntamente com versículos como os de Ezequiel 28.12-19 e Deuteronômio 32.8 (na Septuaginta, "de acordo com o número dos anjos de Deus"); e Efésios 6.12 (por exemplo, kosmokrátoras, "governantes mundiais"), então o caso em favor da territorialidade espiritual torna-se ainda mais compelidor.

Conforme atestam aqueles que fizeram uma visita mais do que casual a lugares como a Índia, as reservas dos ameríndios navajos, os Camarões, o Haiti, o Japão, o Marrocos, o Peru, o Nepal, a Nova Guiné e a China, são consideradas coisas corriqueiras as hierarquias elaboradas de divindades e espíritos. Esses seres incorpóreos são con­cebidos como espíritos que controlam lares, aldeias, cidades, vales, províncias e nações, exercendo um poder extraordinário sobre o com­portamento das populações locais. O fato de que o próprio Deus reco­nheceu o poder vicário de divindades regionais manifestou-se em sua urgente chamada de Abraão, e, mais tarde, na chamada da nação hebréia, dentre os panteões animados dos babilônios e dos cananeus.

POR QUE AS COISAS SÃO COMO SÃO?

Quase todas as pessoas têm tido a experiência de entrar em algu­ma cidade, bairro ou país somente para sentir um desassossego intan­gível ou opressão descer sobre os seus espíritos. Em muitos desses casos, o que encontramos em tais circunstâncias é a atmosfera sufo­cante de outro reino espiritual. De maneira imperceptível para nós acabamos de cruzar uma fronteira espiritual, que faz parte do império de que falou o apóstolo Paulo no sexto capítulo de Efésios.

Outras situações mostram-se ainda mais óbvias. Sem importar a teologia das pessoas, qualquer crente honesto e moderadamente via­jado 

reconhecerá que existem certas áreas do mundo de hoje onde as trevas espirituais mostram-se mais pronunciadas. Sem importar se se trata de cidades coalhadas de índios, como Varanasi e Catmandu, ou a decadência ostentosa de Pataia ou Amsterdão, ou as regiões espiri­tualmente estéreis de Omã ou da parte ocidental do deserto do Saara, em tais lugares a realidade triunfa sobre a teoria a cada instante.

A questão é: por quê? Por que existem algumas áreas espiritual­mente mais opressivas, mais entregues à idolatria, mais espiritualmen­te estéreis do que outras? Por que as trevas parecem medrar onde elas realmente estão?

Uma vez que alguém comece a formular essas questões funda­mentais, é fácil vinculá-las a centenas ou mesmo milhares de situa­ções específicas. Por que, por exemplo, a Mesopotâmia tolerou uma tão longa lista de governantes tirânicos? Por que a nação do Haiti é o exemplo mais deplorável de desastre social e econômico do hemisfé­rio ocidental? Por que as nações andinas da América do Sul sempre parecem encabeçar as estatísticas da taxa de homicídios anuais per capita? Por que há tanta atividade claramente demoníaca nas monta­nhas do Himalaia e em redor delas? Por que o Japão sempre se mos­trou uma noz difícil de quebrar por meio do evangelho? Por que o continente da Ásia domina de tal maneira a Janela 10/40?

Todas as igrejas locais podem apresentar dúzias de outras pergun­tas, acerca de suas próprias comunidades. Não será difícil formulá-las, uma vez que consideremos que pode ser relevante fazer tais perguntas.

No decorrer dos poucos anos passados, minhas pesquisas em busca por respostas a essas perguntas têm-me levado literalmente ao redor do mundo. Isso me tem levado a uma fascinante e instrutiva jornada, serpeando por quase cinqüenta países e produzindo mais de trinta e cinco mil páginas de material documentado — incluindo foto­grafias, livros, mapas, entrevistas e estudos de casos.

Ao longo do caminho, tenho visitado santuários, templos, mos­teiros, bibliotecas e universidades. Tenho subido por montes sagra­dos, examinado cemitérios de ancestrais e tenho remado pelo sagra­do rio Ganges, correnteza abaixo. Tenho ouvido as narrativas de lamas tibetanos budistas, médicos-feiticeiros dos ameríndios, bem como os principais teóricos do movimento da Nova Era. Tenho com­parado notas com missionários e pastores nacionais de proa; entre­vistado antropólogos e estudiosos da pré-história. E tenho sondado as mentes de muitos especialistas que têm profundos conhecimen­tos desde o xamanismo até 

à adoração dos antepassados japoneses, passando pelo folclore do islamismo, a geomancia e as peregrina­ções religiosas.

A súmula desse processo, um livro e uma série de fitas gravadas, intitulados The Twilight Labyrinth, 3 é a seqüência natural do livro The Last of the Giants, bem como do livro que você está manusean­do agora. Quanto àqueles que são sérios quanto à identificação e o desgaste do poder das fortalezas territoriais, este volume oferece o mais abrangente discernimento que se tem publicado até esta data.

O DESAFIO DAS PESQUISAS

Aqueles que têm lido os nossos livros sabem que Peter Wagner e eu concordamos inteiramente que a territorialidade espiritual tem muito a ver com as coisas como elas são, em certas cidades, nações e regiões do mundo atual. E muitos outros — incluindo pastores, missionários praticantes e professores de teologia — têm chegado a uma conclusão similar. Porém, ainda que esse crescente consenso seja encorajador, muitas outras questões e tarefas ainda precisam ser examinadas.

É útil pensar nesse processo em termos das pesquisas médicas que têm acabado de identificar certo vírus como o agente causador por detrás de alguma enfermidade particular. Esta ou aquela pessoa se tem recuperado de forma extraordinária, mas muito trabalho árduo ainda jaz à frente, se esse conhecimento tiver de ser traduzido sob a forma de ajuda prática em favor daqueles que estão sofrendo, ou que estão procurando tratar a enfermidade em foco.

O primeiro passo usualmente consiste em tentar e em conceber algum tipo de instrumento diagnosticador que possa ajudar médicos e pacientes a saberem que estão combatendo uma enfermidade no seu estágio mais primário possível. Isso ajuda a evitar caças ao acaso, em busca de algum tratamento eficaz. Os diagnósticos errados e as ma­zelas fantasmas são, ao mesmo tempo, muito caros e perigosos.

O passo seguinte, para os pesquisadores, consiste em dirigir o co­nhecimento deles para as operações internas de uma enfermidade qual­quer, com vistas à sua cura eventual. Conhecer quais as causas de algum problema, e como detectá-lo pode, em última análise, tornar-se uma car­ga pesada, se esse conhecimento não for o precursor da solução.

Reconhecer o papel da territorialidade espiritual, pois, serve so­mente de ponto de partida quanto a qualquer pesquisa que se propo­nha a 

compreender as razões e as conseqüências dos modernos cam­pos de batalha espirituais. Mas restam ainda certas perguntas perscrutadoras. Como, por exemplo, são estabelecidas as fortalezas espirituais? Como elas se mantêm diante da passagem do tempo? E como são reproduzidas essas fortalezas em outras áreas?

Embora não seja possível, neste breve capítulo, responder com detalhes a cada uma dessas perguntas, pelo menos podemos cobrir os pontos básicos. Ao assim fazermos, nosso ponto de partida será uma simples mas crucial definição. Em que consiste, exatamente, uma for­taleza espiritual? Sem mergulharmos na aplicação do termo à mente e à imaginação, uma observação atenta à variedade de fortalezas territoriais revela duas características universais: elas "repelem a luz" e "exportam as trevas". (Cindy Jacobs descreveu vários tipos de for­taleza, no terceiro capítulo, mas aqui estou tratando acerca do tipo de fortalezas territoriais.)

As fortalezas territoriais são de natureza inerentemente defen­siva e ofensiva. Seus terraplenos escusos desviam os dardos divinos da verdade, pois os arqueiros demoníacos mostram-se sempre muito ocupados a lançar dardos inflamados na direção de alvos desprotegidos, lá fora. Se seus acampamentos de prisioneiros retêm milhares de cativos encantados, os comandos do mal e os centros de controle vivem liberando múltiplas formas de ludibrio, através das hostes espirituais da maldade que eles empregam.

ESTABELECENDO FORTALEZAS TERRITORIAIS

Se tivermos de entender por que as coisas são da maneira como são hoje em dia, teremos primeiramente de examinar o que aconteceu ontem, e também teremos de resolver o dilema da origem delas. De onde elas vieram? Como essas coisas foram estabelecidas?

O ponto de partida óbvio desse tipo de estudo é a torre de Babel. Pois, conforme somos informados no capítulo onze do livro de Gênesis, foi da planície de Sinear, na antiga Mesopotâmia, que um povo geo­graficamente coerente foi disperso por Deus para os quatro cantos da terra. Mas o que aconteceu àquelas populações antigas, ao migrarem de Babel? Artefatos antigos e tradições orais podem oferecer-nos qualquer indício? E, nesse caso, esses indícios têm alguma relevância para a nossa inquirição quanto a entendermos as origens das fortale­zas territoriais?

Antes de passarmos adiante, sinto que devo frisar um fato adi­cional, que pesa sobre a nossa discussão. Colocando a questão nos termos mais simples, os demônios podem ser achados onde quer que estejam as pessoas. Não há motivo algum para eles estarem em outro lugar qualquer. Não encontramos provas, nem nas Escrituras nem na história, que os demônios estejam interessados na criação inanimada ou amoral, como os montes, os rios, as árvores, as cavernas, as estre­las e os animais, a menos que e enquanto as pessoas não se fizerem presentes. A amarga ordem que receberam foi roubar, matar e des­truir aquilo que é precioso para Deus; e, como é claro, os seres huma­nos, criados segundo a imagem de Deus, estão no alto da lista de seres valiosos para Deus.

Essa seria a explicação subjacente das trevas que parecem engolfar tantas cidades do mundo. Sempre e onde quer que as pessoas se con­centrem, para ali os demônios serão atraídos pelo odor delas. Não teria sido por esse motivo que a torre de Babel atraiu tão imediata interven­ção divina? É difícil imaginar que aquela ímpar concentração de seres humanos, na planície de Sinear, não tenha precipitado um dos mais pro­fundos ajuntamentos de poderes demoníacos da história?

Embora pouco se conheça sobre os movimentos originais dos pri­meiros grupos de pessoas que saíram da Mesopotâmia, aquilo que sabemos sugere, pelo menos, um denominador comum da experiência humana — os traumas. Para alguns, era a incapacidade de transpor barragens montanhosas intransponíveis, que bloqueavam o caminho deles. Para outros, teria havido uma súbita falta de alimentos, produzi­da por severas condições climáticas. Ainda outros acharam-se envol­vidos em algum combate mortal.

Quaisquer que tenham sido esses antigos traumas, eles sempre tiveram por efeito fazer as pessoas se verem face a face com os seus desesperos. Como é que eles resolveriam tal desafio? Cada caso es­tava carregado de implicações morais. Cada circunstância serviu de oportunidade para um povo específico, em um lugar específico, para voltar-se para Deus com arrependimento, declarando-o, assim, como seu legítimo governante e único libertador.

Infelizmente, o arrependimento em cilício, que houve em Nínive, tem mostrado ser uma daquelas raras exceções à regra. A esmaga­dora maioria dos povos, através da história, tem preferido trocar as revelações divinas pela mentira. Dando ouvidos aos apelos dos demô­nios, em seu desespero, têm preferido entrar em pactos quid pro quo com o mundo dos espíritos. E como compensação pelo consentimento particular de alguma divindade resolver seus traumas imediatos, os homens têm oferecido a 

sua lealdade singular e contínua. E assim têm vendido, coletivamente, suas almas proverbiais.

É mediante a colocação desses antigos colchões receptivos, pois, que são estabelecidas as fortalezas territoriais. A base da transação é inteiramente moral. As pessoas fazem uma escolha consciente de suprimir a verdade e de acreditar na falsidade. No fim, os homens são enganados por terem preferido ser enganados. Peter Wagner elabo­rou com eloqüência esse aspecto da questão, no próximo capítulo, ao fazer a exegese de Romanos 1.18-25.

Visto que muitos dos mais antigos pactos entre os povos e os poderes demoníacos foram transacionados na Ásia, e a Ásia agora abriga os maiores centros populacionais do mundo, não nos deveria surpreender que esse continente atualmente domine as grandes fron­teiras de povos não alcançados pelo evangelho, dentro da conhecida Janela 10/40. População densa e longevidade têm, ambas as coisas, muito a ver com o entrincheiramento das trevas espirituais.

CONSERVANDO AS FORTALEZAS TERRITORIAIS

Que existem dinastias das trevas é um triste fato da história. A indagação que persegue muita gente é o que sustenta essas dinastias. Se as escolhas mal feitas de gerações anteriores permitiram que as forças demoníacas penetrassem em certas regiões, como é que esses poderes malignos conservam os seus direitos de explorar os territórios durante séculos ou mesmo milênios? Exprimindo a mesma coisa de outra maneira, como é que esses poderes conseguem extensões de arrendamento, depois de terem morrido aqueles que assinaram o con­trato original de arrendamento?

Uma das principais respostas a essa pergunta acha-se na questão da transferência de autoridade que ocorre durante festividades religiosas, cerimônias e peregrinações. Escrevi extensamente sobre esse assunto no livro The Twilight Labyrinth, e um guia cronológico desses acontecimentos, publicado por nosso ministério, The Sentinel Group, serve como manual de contra-ofensiva para intercessores.

Que o poder espiritual realmente é liberado durante essas ati­vidades tem sido confirmado por inúmeros crentes nacionais e por missionários que eles têm entrevistado. 4 Quase todos eles refe­rem-se a um exaltado senso de opressão de crescentes incidentes de perseguição

e, ocasionalmente, de manifestações em larga escala de sinais e maravilhas demoníacos. Estamos vivendo em tempos difíceis, e os crentes com os quais tenho conversado sem­pre alegram-se quando esses incidentes terminam. Somente a ora­ção e o louvor parecem ajudar, e, mesmo assim, algumas vezes eles indagam se as suas orações não são interrompidas pelo mes­mo tipo de valente espiritual que adiou a resposta divina a Daniel (ver Dn 10.12, 13).

Deveríamos notar que as festividades, as cerimônias e as pere­grinações religiosas estão sempre ocorrendo em algum lugar do mun­do, a cada semana do ano. Literalmente, milhares desses eventos têm lugar, desde celebrações localizadas até grandes eventos regionais e internacionais. O dia das bruxas e o hajj dos islamitas são bem conhe­cidos exemplos internacionais; festividades regionais menos conheci­das são a Kumbha Mela, na Índia, o Inti Raymi, no Peru, e as celebrações Bon, de verão, no Japão, que também atraem imensas multidões de participantes.

Tirando a Poeira de Antigos Colchões de Boas-Vindas

Essas celebrações decisivamente não são os espetáculos culturais benignos, esquisitos e coloridos que as pessoas dizem com freqüência que elas são. Antes, são transações conscientes com o mundo dos espíritos. São oportunidades de as gerações contemporâneas reafir­marem as escolhas e os pactos firmados pelos seus antepassados e por seus pais. São ocasiões em que se tira a poeira de antigos col­chões de boas-vindas, ampliando o direito do diabo de governar sobre povos e lugares específicos nos dias de hoje. A significação desses acontecimentos não deveria ser subestimada.

Uma vez que uma população entregue-se a vãs imaginações, os poderes demoníacos logo tiram proveito para animar as mitologias daí resultantes. De uma maneira que nos faz lembrar o Mágico de Oz, agentes espirituais manipuladores põem em prática a arte de governar por detrás dos bastidores, mediante sombrinhas. A autori­dade e a lealdade prestadas a chamadas divindades protetoras são rapidamente absorvidas — e, daquele instante em diante, a mentira vê-se entrincheirada.

Desafortunadamente, centenas de milhares de crianças por dia nascem nesses sistemas de feitiço ao redor do mundo. Quase todas elas crescem ouvindo falar na mentira; mas é durante o curso dos ritos de 

puberdade e das iniciações que muitos deles sentem a sua intensa sucção gravitacional pela primeira vez. O poder da mentira, atiçada pela mágica demoníaca, é chamado de tradição; e são as tra­dições, por sua vez, que sustentam as dinastias territoriais.

Ludíbrios Adaptados

Por mais importantes que sejam as tradições na manutenção das di­nastias territoriais, entretanto, esse não é o único meio usado pelo inimigo para chegar a essa finalidade. Outra estratégia igualmente importante é aquilo que chamo de "ludíbrios adaptados". Essa estra­tégia é empregada quando as tradições, por qualquer razão, começam a perder o seu domínio sobre uma dada sociedade.

Os ludíbrios adaptados, dependendo de como o indivíduo preferir encará-los, ou são correções de curso que se fazem necessários, ou são aprimoramentos da "linha de produção" do diabo. Esses ludíbrios funcionam por causa da propensão da humanidade para experimentar coisas novas. Dizendo a mesma coisa de forma mais crua, e com pedidos de desculpas aos aficionados felinos, o diabo tem aprendido que há mais de uma maneira para esfolar um gato.

Dois exemplos de ludíbrios adaptados dos dias modernos encon­tram-se nas novas religiões folclóricas dos japoneses e dos povos islâmicos. O islamismo folclórico é uma combinação de crenças islâmicas e animistas, e muitas das novas religiões dos japoneses apre­sentam uma curiosa mescla de conceitos budistas e materialistas. Em termos de números de aderentes ou praticantes, ambos os movimen­tos são bem-sucedidos de uma maneira colossal.

Os ludíbrios adaptados não substituem as escravidões ideológi­cas pré-existentes, mas antes intensificam-nas. Nesse sentido, são análogos a um nível coletivo da narrativa bíblica do demônio que volta ao vaso humano desocupado, trazendo agora consigo sete outros es­píritos, piores do que ele mesmo (ver Mt 12.43-45; Lc 11.24-26).

SERVIDÕES PREVALENTES E SERVIDÕES ARRAIGADAS

Agora que já estamos armados com a compreensão sobre os papéis desempenhados pelo ludibrio adaptado, pelas tradições e pe­las 

festividades religiosas, na manutenção das dinastias territoriais, precisamos ainda aprender uma lição final. Essa lição tem a ver com o discernimento da diferença entre as "servidões prevalentes" e as "servidões arraigadas". Devido à ausência de ensino sobre o assunto, os guerreiros evangélicos com freqüência deixam-se enga­nar pelas aparências superficiais, quando se esforçam por identifi­car as fortalezas territoriais.

Um bom exemplo desse fato foi levantado pelo grande número de pessoas que, poucos anos atrás, insistiam que a fortaleza espiritual so­bre a Albânia era o comunismo do tipo stalinista. Mas, embora não haja como duvidar que esse tipo de comunismo fosse a servidão prevalente na ocasião, também muitos aceitavam que essa também era a fortaleza arraigada. A falha nesse raciocínio torna-se óbvia quando considera­mos que o comunismo só veio a tornar-se a ideologia predominante no país em 1944. A significação desse fato é que, por mais vil e destruidor que tenha sido esse sistema de ateísmo, só está instalado ali faz cerca de cinqüenta anos. A história da Albânia, antes disso, retrocede até à região bíblica do Ilírico, e remonta a muitos milhares de anos.

Sistemas similares de última hora também podem ser encontra­dos na Mesopotâmia, no Japão e em outras áreas do mundo. Esses sistemas representam ideologias superficiais que chegam e se vão jun­tamente com o vento. Embora não possam ser ignorados, por outra parte não devem ser confundidos com o subsolo espiritual que precisa ser quebrado se tivermos de entreter esperanças legítimas de que veremos as fortalezas espirituais serem invadidas com sucesso por meio do evangelho.

A EXPANSÃO DAS TREVAS

Tendo examinado a pergunta de como as fortalezas espiritu­ais são estabelecidas e mantidas, voltamo-nos agora para a ques­tão da expansão territorial. Nesse ponto ficamos interessados em saber se o reino das trevas é geograficamente dinâmico; e, se realmente assim acontece, como tais fortalezas são reproduzidas em outras áreas.

No meu livro, The Twilight Labyrinth, devotei um capítulo intei­ro à dinâmica territorial, intitulado de "Caminho da figueira-de-bengala". Conforme o próprio título sugere, baseei a ilustração sobre essa árvore tropical, com seus ramos que se estendem e com suas raízes aéreas descendentes, que servem de excelente analogia da maneira como se expande o império das trevas.

Começando com um único tronco maciço, os ramos sinuosos da figueira-de-bengala estendem-se lateralmente em todas as direções. Dali, naquilo que sem dúvida é a característica mas notável dessa espécie vegetal, as raízes aéreas que descem até o chão vão forman­do novos troncos. Dessa forma, a figueira-de-bengala pode mover-se lateralmente por grandes distâncias — ao mesmo tempo em que vai criando uma moita trançada quase impenetrável, com seus muitos tron­cos e ramos parecidos com a da parreira.

Esses ramos que se estendem e essas raízes descendentes re­presentam as duas maneiras como a expansão territorial tem lugar: "exportação ideológica" e "fortalezas produzidas por traumas". A exportação teológica, que é uma extensão territorial das fortalezas territoriais, é efetuada mediante a propaganda de ideologias ou de influências espirituais, a partir dos locais de transmissão, ou centros de exportação, que existem em várias áreas do mundo. Exemplos de centros assim incluem o Cairo, Trípoli, Karbala, Qom e Meca, no mundo islâmico; Allahabade e Varanasi, no mundo do hinduísmo; Dharamsala e Tóquio, no mundo budista; e Amsterdão, Nova Iorque, Paris e Hollywood no mundo materialista. Se antes os escudos defletores dos valores judaico-cristãos impediam que esses venenos penetrassem profundamente demais na América do Norte, a erosão da lealdade cristã, em anos recentes, infelizmente tem chegado a significar que, em um número crescente de instâncias, agora o inimi­go somos nós mesmos.

Outra maneira pela qual o inimigo expande o seu reino no mundo é mediante a indução de novos traumas. Tendo aprendido, com base nas experiências passadas, o quão eficazmente as cir­cunstâncias desesperadas podem atrair para a sua teia homens e mulheres, o inimigo por muitas vezes usa a ganância, a concupiscência e a desonestidade de indivíduos depravados a fim de deflagrar novas crises.

Um exemplo gráfico de uma fortaleza induzida por um trauma, no mundo ocidental, é o Haiti. Tirando proveito da ganância dos afri­canos efiques e dos negociantes franceses de escravos, grandes números de africanos da África Ocidental foram trazidos para a área do Caribe e maltratados até ao ponto do desespero. Preferindo resolver os seus conflitos entrando em novos pactos com o mundo dos espíritos, aqueles escravos estabeleceram um sistema de adora­ção e de governo secreto alicerçado sobre o animismo, conhecido como vodu. Atualmente, as negras recompensas desse sistema são largamente conhecidas, conforme Peter Wagner passará a demons­trar, no próximo capítulo.

Será possível que o plano de Deus para a sua Igreja é completar a Grande Comissão no mesmíssimo solo onde o mandamento original foi entregue à primeira família da terra?

A GERAÇÃO DO LIMIAR

Conforme os exércitos do Senhor Jesus Cristo vão começando a completar a tarefa da evangelização do mundo, na chamada Janela 10/40, é curioso que o centro geográfico dessa região seja o local do antigo jardim do Éden, isto é na região do moderno Iraque (ver Gn 2.8-14). Será possível que o plano de Deus para a sua Igreja é com­pletar a Grande Comissão no mesmíssimo solo onde o mandamento original foi entregue à primeira família da terra? (Ver Gn 1.27, 28.)

Qualquer que seja a resposta a essa indagação, é claro que os guerreiros evangélicos, que ousarem marchar para essa linha final de combate, terão de enfrentar uma formidável oposição, da parte de um adversário implacável e invisível. Se a missão para liberar prisioneiros fascinados tiver de obter sucesso, será mister obter um acurado co­nhecimento a respeito das questões internas do inimigo e de seus cen­tros de controle, bem como o equivalente espiritual dos óculos de vi­são noturna, usados pelas forças armadas.

É impossível desdobrar três anos de dados colhidos e injetados em um mapeamento espiritual em um único capítulo. Não obstante, é minha esperança de que essa informação pelo menos deixará os leitores em estado de alerta, a saber, os leitores que estão contemplando iminentes missões de salvamento, alicerçados sobre o fato de que novos instru­mentos se estão tornando disponíveis para guiá-los através do emara­nhado e dos volteios desse labirinto das horas do crepúsculo.

Perguntas para refletir

1. Discuta sobre o conceito da "territorialidade espiritual". Você con­corda que os principados espirituais da maldade poderiam ser alocados por Satanás a certas regiões geográficas?

2. Este capítulo sugere que as festividades religiosas podem reforçar a autoridade dos poderes malignos sobre uma área. Nomeie e dis­cuta tantas dessas festas quantas você puder lembrar.

3. Você já experimentou uma sensação quase física de trevas e de opressão, em certas áreas de sua cidade ou nação? Compartilhe de suas sensações com outros crentes.

4. As fortalezas demoníacas que dominam uma cidade ou uma nação podem ser induzidas por traumas. Pode você pensar em tais trau­mas dentro da história de sua cidade ou nação que poderiam ter produzido fortalezas espirituais da maldade?

5. Faça uma revisão da distinção feita por George Otis, Jr., entre os conceitos "extrabíblicos" e "antibíblicos". Você concorda com essa distinção?