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Capitulo IV
Capitulo IV

 

A partir daí passamos a desenvolver uma série de pequenas experiências todas as reuniões. Muitas outras eram dadas para serem feitas individualmente durante a semana, e depois comentávamos em aula, discutíamos os resultados individuais.

O ato de esvaziar a mente e entrar em simbiose com o Vazio tornou-se tão corriqueiro que até perdeu a graça. Aprendemos a entrar naquele estado muito facilmente. Atingido este nível, Zórdico passou a induzir o Grupo na arte de “dar asas à imaginação”. Parecia realmente uma brincadeira de faz-de-conta, no princípio. Houve uma infinidade de exercícios semelhantes que visavam sempre o mesmo propósito: estimular a imaginação.

Certa ocasião Zórdico orientou-nos a projetar uma rosa bem diante de nossos olhos. Devíamos imaginar que chegávamos perto, muito perto dela, tão próximos que começávamos a ver e sentir a textura das pétalas. Mergulhávamos por entre elas, atingindo o centro, descendo por dentro do caule junto com a seiva, explorávamos as raízes. Doutra feita, uma grande seta vinha em nossa direção. A ponta dela lentamente aproximava-se de nossas cabeças, e terminava entrando dentro de nós pelo chakra do meio das sobrancelhas. Uma outra vez, um pouco antes da seta entrar nós nos imaginávamos transportados para a seta, e então nós éramos a seta. Eu me imaginei entrando dentro de mim mesmo, descendo pela medula espinhal até o fim e então caindo dentro da pelve, no meio das vísceras quentes e pegajosas.

As experiências pareciam não acabar mais. Era muito doido imaginar o que não imaginaríamos nunca! Era gozado... produzia às vezes uma sensação estranha!

Mas por que fazíamos aquilo? Eu ainda não tinha compreendido bem.

— As pessoas são diferentes, há quem se adapte melhor a este ou aquele método. Até então são apenas exercícios, nada disso é real de fato. É apenas uma maneira de estimular a todos! — Disse-me Marlon, explicando, mas sem explicar nada. — Mas vai chegar o momento em que será real! Vocês serão capazes de ser detentores de grandes Poderes! Nem todos alcançarão este estágio. Por enquanto todos caminham juntos, mas você já aprendeu que o potencial individual é... individual. Alguns irão mais à frente... outros não chegarão à tanto! Mas por enquanto, todos são capazes de acompanhar.

Grandes Poderes... o que ele queria dizer exatamente? Coisa de louco???? Sei lá...!!!

Mas eu queria ver no que ia dar. No fundo, eu achava que Marlon estava exagerando um pouco, prometendo coisas que... enfim... o fato é que, fruto de mera sugestão ou não, realmente experimentávamos sensações ímpares e intensas. Algo que fugia à explicação da racionalidade, que ultrapassava os limites da coincidência. Alguma coisa de fato havia por trás daquelas práticas. Se íamos realmente ter tanto Poder assim, eu não sabia. Mas que acontecia algo diferente, isso era inegável: acontecia mesmo!

***

Ao mesmo tempo em que alguns exercícios tinham este objetivo de deixar a Imaginação rolar, outros eram quase que exatamente o contrário: eram para treinar a Concentração.

Muito simples, por exemplo, uma vez acendemos uma vela bem perto de nós. Deveríamos observá-la por cerca de três minutos mais ou menos e então, fechando os olhos, a vela deveria manter-se inalterada o maior tempo possível em nossa mente. Não era tão fácil como parecia, a tendência é de que a vela rode de um lado para o outro ou assuma uma posição mentalmente difícil de mudar. Mesmo assim deveríamos nos esforçar para mantê-la parada e no centro.

Pequenos exercícios nesse sentido ocuparam várias das aulas e das semanas seguintes, a tal ponto que eu já quase me via meio saturado daquilo.

Nesse meio tempo, talvez para me estimular um pouco, Marlon ensinou-me à parte um jeito diferente de atingir o estado “alfa”. Era praticamente instantâneo! Passava direto para aquela já conhecida sensação de vagar na névoa, a simbiose com o Vazio. Em última análise, criou-se uma espécie de reflexo condicio­nado, quase como uma “auto-hipnose”. Treinamos tão exaustiva­mente que funcionava a maior parte das vezes. Depois ficou tão fácil que bastava apenas contar de três até zero, fazer um pequeno sinal com os dedos e, ao chegarmos no zero, já tinha funcionado.

Mas por que tantos exercícios?!!

— Logo vocês estarão aptos para entrar de fato em contato com a nova Verdade da qual eu falei no início. Ela virá preenchê-los completamente. — Falou Zórdico. — Sem este treinamento se­ria impossível! A liberação do máximo de potencialidade mental pode ser atingido de várias maneiras. Os exercícios servem justa­mente para isso, estimulam capacidades latentes dentro de vocês, mas não é só! A mente de vocês precisa ser “preparada” para aceitar um mundo novo, um mundo que não é regido pelas leis que conhecemos. Os exercícios que temos feito, incessantemen­te, têm esta dupla finalidade. Por mais que pareçam sem sentido ao final deles vocês estarão com a mente pronta. Esvaziada, desbloqueada, e apta para entrar em contato com uma realidade diferente!

Houve momento de estimularmos sensações também atra­vés das vozes e da audição. Para isso foram-nos ensinados alguns mantras.

Era incrível! Este tipo de estímulo fazia com que experi­mentássemos coisas muito diferentes, mais do que vínhamos ten­do até então. Parece que nossa sensibilidade tinha aumentado muito. Quando entoávamos os mantras em uníssono, em profun­da concentração, realmente parecia haver uma estranha liberação de força e Poder. Algo muito claro. Não podíamos palpá-las mas eram nitidamente captadas pelos sentidos. Todos nós percebía­mos aquela densa emanação. Até o ar parecia assumir uma vibra­ção diferente.

Eu senti o Poder de um forma especial pela primeira vez uma ocasião quando entoávamos o mantra “OHM” e estávamos todos sentados ao redor de uma enorme tina contendo água. Zórdico havia colocado dois palitos de fósforo sobre a superfície da água que, nesta altura, somente boiavam a esmo. Durante a cantilena, sentindo a energia crescente que emanava de nós e nos envolvia, a um sinal de nosso mestre estendemos as mãos para a tina. Lentamente os palitos começaram a mover-se, depois a rodar, por vezes até em sentidos opostos. Aquilo era tremendo! Pelo menos eu achava assim naquela época. Mais tar­de eu viria a compreender que forças efetivamente causavam aque­les fenômenos.

***

Aqueles meses e aquele treinamento intensivo aos poucos começaram a nos fazer perceber que havia realmente uma ener­gia dormente em nós! E ela podia ser liberada de uma forma “or­denada”, até mesmo ao ponto de alterar a matéria, como no caso dos palitos. Isso também acontecia com o pêndulo, conforme pude ver mais tarde, em exercícios de radiestesia.

Já não questionávamos tanto o por quê dos exercícios pra­ticados. “Por que isso?”, “Por que assim?!”. Pois já descobríra­mos para quê serviam, isto é, para atingir finalmente os almeja­dos cem por cento de nossa capacidade mental. Sabíamos agora que a potencialidade aumentaria de forma exponencial até atingir o seu platô.

Marlon deu a Thalya um exemplo que não vou esquecer, com a intenção de exemplificar o processo como um todo.

— É como aprender a nadar. Primeiro a criança aprende a entrar dentro d'água sem medo, a por a cabeça toda dentro da água; aprende a soltar bolhinhas de ar na borda da piscina; depois faz exercícios isolados com os braços, depois com as pernas; uti­liza a ajuda da prancha para unir o batimento de braços e pernas de forma sincronizada. Os exercícios em si, de forma isolada nada significam e não têm importância em si mesmos. Mas a finalidade deles é o que importa, e eles levarão o indivíduo a uma arte muito maior: o ato de nadar. De frente, de costas, de peito, como golfi­nho...! Alguns nadarão melhor do que outros. Serão mais capazes em um ou outro estilo. Uns vencerão grandes distâncias... outros serão velozes.. . dá prá entender?!?

Eu e Thalya balançamos a cabeça, mudos. Não havia ne­cessidade de mais perguntas, mesmo assim, ele concluiu:

— Não pensem que o que estão aprendendo agora é a Magia em si, porque não é! Estão fazendo exercícios, apenas... de bra­ços, pernas, respiração, etc. Mas logo estarão aptos para uma Arte maior!

Era bem claro, por que tanta dificuldade em enxergar o óbvio antes? Especialmente para mim, acostumado à prática do Kung Fu, era tão simples... eu treinava meus músculos com exer­cícios específicos para cada grupo que queria desenvolver. Da mesma forma eu também sabia que o desenvolvimento muscular tem seu limite. Uma vez atingida a potência máxima todo incre­mento deixa de ser significativo.

No Grupo acontecia a mesma coisa, só que nós treináva­mos a mente ao invés dos músculos. Mas o princípio era o mes­mo. Como não tinha percebido antes aquele paralelo? Aquilo me ajudou a ter paciência com o que parecia moroso; era necessária uma base sólida para construir algo sólido.

Mas o que estimulava mais do que tudo no Grupo era saber que, ao invés de chegarmos a um limite e estagnarmos nesse pata­mar, como um músculo que não hipertrofia mais, a proposta ali era bem diferente. Tínhamos a promessa firme e segura de Zórdico, de que uma vez atingida a potencialidade máxima seríamos indi­vidualmente capacitados por outras forças. Que iam além do pla­no físico. Que tinham a ver com as dimensões paralelas...

Em outras palavras: não haveria limites ao crescimento do Poder.

Os exercícios duraram semanas.

Aparentemente aleatórios, nunca pareciam ter seqüência ou lógica aparentes. Mas agora eu compreendia o propósito e o empenho de Zórdico em deixar o Grupo bem afinado naquele sentido. Era de fato necessário que nos defrontássemos com sen­sações, conceitos e idéias que antes não conhecíamos. Era neces­sário estarmos familiarizados com elas para o que viria depois!

Eu aguardava, ansiosamente, o fruto: a capacitação para exercer uma nova Arte.

Começamos depois a praticar- supervisionados — todas as Artes Mágicas. Aquilo que tínhamos aprendido teoricamente começou a descortinar-se como algo que podíamos efetivamente usar.

Aprendemos a jogar cartas uns para os outros. Ler a mão uns dos outros. Novos conceitos astrológicos começaram a ser introduzidos. Aprendemos a tirar conclusões usando o pêndulo na radiestesia. A radiestesia também começou a ser usada para pequenas práticas de hipnose.

A cromoterapia tinha um princípio mais ou menos seme­lhante às manipulações de ervas: mexiam com o sistema nervoso central. Uma cor, por exemplo, nada mais é do que um reflexo de luz num determinado comprimento de onda. Estes sinais são cap­tados pela retina, convertidos em impulsos elétricos e sensibili­zam a área visual do córtex. O cérebro faz uma leitura e produz uma reação bioquímica, que estimula as mais diversas sensações. A grosso modo, tanto cores como odores teriam capacidade de induzir sensações outras além do simples estímulo visual ou olfa­tivo. Estas “sensações outras” podem ser positivas ou negativas e isso induziria, em última análise, à reações orgânicas positivas ou negativas. Levando a benefício ou malefício do organismo como um todo!

— Por exemplo. — Dissera Zórdico. — Imagine alguém en­trando numa sala totalmente pintada de vermelho. Existe toda uma herança social ligada à cor. Há uma essência na alma humana que associa inconscientemente o vermelho ao sangue. E neste caso sangue está associado à morte, pois sangue jorrando nunca lem­bra algo bom. Então a pessoa não apenas a cor, mas junto com ela vem todo um conjunto de sensações que geram desconforto. O simples fato de ver a cor levou à ativação de uma memória inconsciente que, no caso, é negativa. O cérebro faz uma leitura subliminar daquilo, e vai interpretá-la. E o organismo libera uma corrente de reações bioquímicas, palpáveis ou não. Que termi­nam por influenciar todo o corpo e mente. Mas imagine se a sala fosse totalmente pintada de azul celeste: percebe como a sensa­ção é de paz, de plenitude, de liberdade, de satisfação? Basica­mente as cores muito “carregadas” e que fogem às tonalidades do Arco-íris causam sensação de mal estar. Porque levam o indiví­duo a sair da sintonia com a Natureza e com o Cosmo.

Exercícios nesse sentido foram feitos também. Não havia coincidência. Todos tiveram reações semelhantes tanto com co­res como com odores.

A aromaterapia em especial é uma Arte antiqüíssima e é como uma “subdivisão” dentro do contexto da manipulação de Ervas. Vem desde os tempos mais remotos. Na Mesopotâmia An­tiga já era difundida sua prática. Os Druidas também faziam po­ções aromáticas, os Egípcios idem. Nos dias de hoje a maior parte desses conceitos se perdeu no tempo. Para o leigo em geral, que não conhece a questão de forma mais ampla, tudo que se refere a odores é apenas “aromaterapia”. Mas em termos de Artes Mági­cas, os incensos e poções aromáticas são muito mais do que isso. No entanto, o mais importante para nós era que o uso des­sas técnicas não deixava de ser uma maneira de aumentar a capa­cidade de percepções “extra-sensoriais”.

O desdobramento, ou viagem astral, consistia em desligar temporariamente o nosso espírito do corpo físico. É uma prática que em nosso meio, pelo menos, tem maior difusão através da Nova Era.

De cara ficou claro que muitas das técnicas que estávamos aprendendo tinham sido proibidas por Deus. A leitura das cartas, das mãos, dos astros — assim como o desdobramento — foram co­locadas no saquinho de rótulo “Esqueça”. “O Senhor teu Deus não te permitiu tais coisas....”.

É fato que Deus proibiu o desdobramento, por exemplo, mas em diferentes ocasiões Ele mesmo transportou alguns dos seus “em espírito” para outros lugares. Mas e daí?! Que vanta­gem tem o homem nesse contexto? Não passa de um robô. Desti­tuído de vontade própria, e sem liberdade de desenvolver um po­tencial que só existe porque foi concedido pelo próprio Deus!

Mas o conhecimento nos estava sendo revelado para que, primeiramente, soubéssemos que tudo aquilo era possível. E, em segundo lugar, em futuro bem próximo, pudéssemos usar cabal­mente tais práticas a nosso favor, sem depender de nada e nem ninguém!

O desdobramento me despertou a atenção logo de cara. Foi-nos dito que ele capacitaria o deslocamento no tempo-espaço de uma forma muito além de tudo o que já tínhamos imaginado. Es­tando fora deste corpo limitado às Leis da matéria pode-se expe­rimentar um outro Universo completamente diferente. Além do que, no devido tempo, seria um facilitador à compreensão do rei­no espiritual e das outras dimensões que não faziam parte da nossa realidade.

Foram usados alguns elementos descartáveis para propici­ar as experiências. E nos foi permitido experimentar a sensação da projeção astral, mas sem concretizá-la plenamente. Isso seria feito mais tarde.

Foi como levitar, flutuar um pouco acima do meu corpo. E voltar. Flutuar de novo. E voltar. Flutuar...mas sem ir adiante.

***

Nem bem cheguei da rua o telefone tocou. Eu mesmo aten­di, quase derrubando o copo de água.

— Oi! — Fez uma voz super conhecida do outro lado. — Sou eu.

Não era Camila.

— E aí, Thalya?! Que que manda? — Eu me joguei de costas na poltrona após engolir a água.

Não deu para ficar muito tempo. Meu pai assistia TV esti­cado no sofá e virou-se para mim:

— Vai conversar lá embaixo, Eduardo! — Grunhiu ele com o controle remoto na mão, aumentando o volume.

Desci para o porão aos trambolhões. Arranquei o tênis dos pés, sentando com as costas apoiadas contra a parede. Tirei o fone do gancho: eu não a via há alguns dias, desde a última quinta-feira na reunião. Ela tinha faltado na escola na sexta. E durante o final de semana fiz um pouco da via sacra costumeira, almoçando em casa de Camila no sábado e indo ao cinema à noite, coisas assim.

— Como foi o final de semana? — Perguntei eu.

— Nada especial! Saí com um cara que conheci na casa da Mônica. Mas era um babaca e já dei o “chega para lá nele”. Nem deu para o gasto. Se eu te contar, você nem vai acreditar aonde ele me levou!

Eu me poupei de perguntar. Mesmo assim ela explicou com mais meia dúzia de frases como foi o famoso fim de semana, mas logo mudou de assunto.

— E você? Bancou o bom samaritano indo para a Igrejinha?! — Indagou ela, irônica. E podia sentir o arzinho sarcástico da pergunta.

— Pois é! Não fui, não! Se você achou babaca o cara com quem saiu é porque não conhece o Pastor daquela Igreja! — Senti uma revolta crescendo dentro de mim. — Aquele lugar rescende a hipocrisia! Não dá para suportar!!! É pior do que os doze traba­lhos de Hércules.

— É pior do que fazer os doze trabalhos de uma vez só! Louquinho!!

Dei um muxoxo seco enquanto puxava os cabelos para trás.

— Bom...é que as vezes a gente é obrigado a cumprir o pro­tocolo. Mas Camila já não me pega com tanta facilidade.

Thalya não respondeu. Dificilmente ela dava palpite no meu relacionamento com Camila. Não deixava de ser uma demonstra­ção de respeito. Mas ela era incapaz de compreender porque eu me submetia àquele “jugo”. Aliás, eu também não sabia. Deixa­mos para lá.

— Você quer dar uma treinadinha nos exercícios de telepa­tia? — Perguntou Thalya mudando radicalmente o assunto.

Concordei de pronto, esquecendo a raiva que me causava o mencionar do Culto. A telepatia era como que um “medidor” do quanto nós já havíamos desenvolvido nossa potencialidade mental.

— Pode ser. Pega um papel e uma caneta que eu vou fazer o mesmo. — Larguei o fone e me preparei. — Alô? Pronto? Manda aí! Você quer começar?

— Tá bom. — Respondeu — Thalya. — Escreve alguma coisa no papel.

Sem pensar muito, escrevi em letras de forma: Máquina de lavar.

— Escreveu? — A voz dela veio aguda pelo telefone.

— Escrevi.

— Tá, não dá dica nenhuma!

Houve silêncio por cerca de dez a quinze segundos. Eu ouvia o resfolegar leve da sua respiração. E a resposta veio logo”

— Máquina de lavar! — Gritou ela em tom afirmativo

— Acertou. Agora é minha vez.

— Não! Não! Faz aí mais alguns.

Concordei a escrevi sucessivamente diversas palavras a esmo. Guarda-roupa, nunchaku, doce de melão, calça jeans e “heavy metal”. De pronto na primeira tacada ela acertou todos.

— Muito jóia, só que agora é minha vez. — Retruquei.

— Tá bom. Peraí, peraí. Hum...hum...tá! Já escrevi.

Respirei profundamente, acessei meu estado “alfa” como já havia aprendido, concentrei e esperei. Em questão de poucos segundos, ela veio. Como um sopro, a palavra brotou em minha mente. Vinda não sei de onde. Só sei que vinha, aparecia.

— Orquídea branca? — Meu tom de pergunta não era para confirmar se a palavra era mesmo aquela. Apenas demonstrava admiração pela opção.

— É. — Fez ela simplesmente. — “White Orquídea” foi o nome do cocktail que tomei a noite toda, no sábado, junto com o babaquinha. Foi a única coisa que valeu a pena!

— Tá bom, então continua.

E eu também respondi corretamente tudo aquilo que “telepaticamente” transferimos de uma mente para outra.

Herbert. Romeu e Julieta. Vestido longo. Férias. Barco a vela. Piano.

Aquele tipo de experiência já não era novidade, apesar de iniciado há pouco no Grupo. No começo acertávamos algumas vezes, outras vezes não. Mas à medida que nos exercitávamos percebemos que a brincadeira se tornava cada vez mais fácil.

Mas as palavras tinham que ser escritas no papel, senão não dava certo. Ninguém lembrou de questionar por quê. Estáva­mos fascinados porque dava certo mesmo! E o fascínio dominou tudo o mais, era fantástico!

Eu estava encantado. Bem mais para frente aprendemos uma outra forma de sinalização, uma espécie de gesto feito com as mão que simbolizava o ato de “pedir entendimento”. Não havia, portanto, necessidade de buscar a concentração do estado “alfa”. Nessa altura, a resposta parecia vir na mente como um sopro quase audível.

***

Foi então que Zórdico começou a falar dos “Guias”.

Os Guias são os seres que ocupam as dimensões superio­res. Isso nós já sabíamos. Mais tarde a informação foi complementada. Só que nem todos no Grupo receberam o restan­te da informação.

***

Ao mesmo tempo em que estávamos entretidos com os exer­cícios e as primeiras experiências práticas com as Artes Mágicas, o processo de desvinculamento da cultura conhecida e de tudo o que havíamos aprendido continuava.

Nesse momento isso passou a se resumir em desbancar com­pletamente todo e qualquer resquício de ideologias Cristãs. Era até claro o por quê daquilo. Não há como receber nenhuma outra doutrina sem primeiro quebrar as bases da doutrina Cristã. Nós tínhamos que deixar de olhar para o mundo através dos “óculos” dos dogmas religiosos. O processo como um todo aconteceu na­turalmente, de tanto ouvir falar a respeito.

Uma vez que se prova, pela própria Bíblia, que a Palavra de Deus não vale nada... não há outra alternativa senão voltar-se para outra coisa. Seja lá o que for!

A melhor maneira de fortalecer qualquer outra doutrina é enfraquecer a Palavra de Deus. E foi o que aconteceu... ainda que talvez nós não nos tenhamos dado conta plenamente disso na época em que aconteceu.

E a Palavra de Deus foi deixando de ter qualquer significa­do na medida em que começamos a perceber que Deus era completamente.. . louco!

***

A Bíblia foi esmiuçada em seus detalhes. Eu não conhecia Bíblia o suficiente para julgar se o que eles diziam tinha proce­dência ou não. Mas que tinha muita lógica, ah!... Isso tinha!

Tudo foi questionado. E tudo o que foi questionado foi re­tirado da própria Palavra.

A Justiça de Deus foi colocada em cheque... o Amor de Deus foi desmentido... a Onisciência, a Onipresença foram jogadas no lixo... a Onipotência foi completamente destruída... que fazer di­ante das evidências que me foram apresentadas e que pareciam não ter mais fim???!!!.....

Os slides projetados na parede, imensos, traziam à tona toda a realidade do cotidiano humano: guerras, fomes, misérias, de­sastres, cataclismos, pestes; crianças mutiladas, deforma­das... doenças medonhas... sofrimentos indescritíveis...

E embaixo os versículos, que começaram a me incomodar: “Rendei graças ao Senhor porque ele é bom, e a sua misericórdia dura para sempre.” Ou então: “A Terra está cheia da bondade do Senhor”.

Parecia uma piada de mau gosto. Deus era o grande vinga­dor da História. O que amaldiçoa a hereditariedade, o que faz o justo pagar pelo injusto.

A análise de textos bíblicos revelou-se cheia de contradi­ções. Deus sempre se arrepende do que faz! “Então se arrependeu o Senhor de haver feito o homem sobre a Terra...”; “O Senhor se arrependeu do mal que dissera havia de fazer ao seu povo.”; “E o Senhor se arrependeu de haver posto a Saul Rei sobre Israel.”; “Assim diz o Senhor: (...) Estou arrependido do mal que vos te­nho feito”; “Então o Senhor se arrependeu disso. Não acontecerá, disse o Senhor.”

Será mesmo que os Seus olhos estão em todo o lugar?! Se Ele tudo sabe e está em todo lugar, não haveria o por quê se arre­pender.

Deus também revelou-Se incongruente: Alguém que dá uma ordem hoje, mas amanhã muda de idéia. Disse para o homem só ter uma mulher, mas Salomão teve mil.

Condenou o incesto, mas Ló teve relações com as duas fi­lhas; elas o embebedaram justamente para esse fim. Detalhe: essa era a única família que prestava, tanto é que foram poupados em Sodoma e Gomorra! Até parece que um homem embriagado consegue ter uma ereção, manter a ereção. A bebida é depressora do sistema nervoso! Essa coisa de dizer que Ló estava bêbado, que “fez sem querer” é conversa prá boi dormir, pura desculpa.

Deus também diz “Não façam imagem de escultura”. Con­denou o bezerro de ouro. Mas depois o mesmo Deus falou para Moisés fazer uma serpente de ouro no deserto.

Quanta loucura!...

E que dizer do Poder de Deus? Se o objetivo Dele era es­tender um Reino sobre a Terra... que fracasso! Ao olhar para o mundo não se vê o Poder de Deus em quase lugar nenhum. O Poder Dele não se manifesta. Simplesmente não se manifestai Ao longo da História os Cristãos foram massacrados, o povo judeu foi massacrado... e o Poder de Deus continuou sem se manifestar. Os Seus filhos são queimados, torturados, esmigalhados... e o Seu Poder é só para constar.

A própria nação norte-americana foi usada como exemplo: um país de rótulo Protestante mas que estava totalmente domina­da por outras forças, exportando para o mundo as grandes contra­dições da sua fé!

E a doutrina Cristã, nascida das incongruências Divinas, continua batendo o record da falta de lógica. Que dizer da velha história da figueira?! Que dizer da bondade de Deus, do Amor imensurável... mas que é anulado pelo pecado e condicionado às atitudes dos homens?

O Cristianismo é dividido, ninguém se entende... estes são os escolhidos? Os eleitos de Deus?! Os embaixadores do Reino? Que não conseguem nem decidir no que crêem e no que não crêem? Que montaram a “casa dividida”?

Se a Religião Cristã for espelho do Criador... que espécie de Criador era aquele???

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Os exemplos não acabavam!

***

Era mais uma daquelas reuniões específicas. Já acontecera por diversas vezes. À medida que os meses passaram e os temas genéricos foram absorvidos, os membros do nosso Grupo iam sendo  convocados — ou não — para reuniões aonde assuntos específicos  eram abordados. Quem não era convocado simplesmente nem ficava sabendo que as reuniões aconteciam. Era óbvio que eles não mais continuariam aquela jornada do conhecimento.

Normalmente éramos em apenas cinco pessoas: eu, Thalya (que era convocada sempre junto comigo), e mais três pessoas, dois homens e uma mulher do nosso Grupo. Um dos rapazes era estudante da melhor Universidade paulista; o outro era mais ve­lho e muito envolvido com tudo que dissesse respeito à Nova Era. A mulher, ao que parecia, era descendente de bolivianos ou algo assim, com longos cabelos e sotaque característico.

Outras vezes havia mais gente nessas aulas, gente que vinha de outros Grupos para aprender conosco.

Era claro que as aulas estavam ficando cada vez mais sele­tas. Marlon sempre me acompanhava e estava presente em todas as reuniões. E Zórdico também, era ele quem continuava palestrando.

Marlon foi o primeiro a deixar bem claro o quanto eram importantes estas reuniões, e continuava me incentivando:

— E algo muito especial. E somente pessoas especiais têm acesso às informações que você vai ter. Somente uns poucos es­tão sendo preparados para escutar certas coisas. O restante do Grupo que você freqüentou até agora não foi escolhido para isso.

Aquilo gerou um clima de expectativa muito grande. Além da alegria por ter sido escolhido para mais aquela etapa. Uma sensação estranha... boa... porque cada vez mais adentrávamos nos segredos do Oculto.

Já não nos questionávamos a respeito de coisa alguma. Es­távamos convencidos, havia evidências de sobra colhidas ao lon­go daquela jornada. Críamos estar descobrindo a verdadeira Ver­dade. Estávamos cada vez mais convictos.

E, quanto mais convictos, mais queríamos.

— Vocês tomarão ciência de segredos importantes, coisas que não confiaríamos a qualquer um. — Salientou Marlon.

No seleto grupo que incluía a mim e Thalya, eu era o mais novo dos rapazes e Thalya a mais jovem das moças. Os que vinham de fora variavam muito.

Nós nos reunimos algumas vezes.

E foi nestas ocasiões que comecei a ouvir falar, pela primeira vez, algo mais claro acerca de Satanismo.

***

A primeira coisa foi a respeito dos Guias. O complemento da revelação. O que nem todos puderam saber em detalhes.

Zórdico foi bastante explícito, sem devaneios agora. E muito simples ao mesmo tempo.

— Vamos remover totalmente o véu aos que podem receber a informação: os Guias são os anjos caídos, os anjos do Fogo, os anjos das Trevas. Os demônios. Aqueles que vieram junto com Lucifér, na Rebelião, porque discordaram de Deus. Abandona­ram os Céus e se dirigiram para a Terra. E habitam em dimensões espirituais paralelas à nossa.

Ficamos em silêncio. No fundo aquilo não tinha nada de chocante!

— Mesmo tendo abdicado dos Céus, ainda assim o Poder deles foi completamente mantido! Veremos isso um pouco mais para frente. Como vocês sabem, Lucifér tem um Poder especial, um Poder acima dos anjos.

Eu não compreendia muito bem aquilo, se Lucifér era tam­bém um anjo, um Querubim, por que teria mais Poder do que os demais?

— Como a própria Bíblia afirma, Lucifér era um Querubim “Ungido”. O antigo Querubim da Guarda. Depois da Trindade ele era o maior de todos. Colocando numa linguagem nossa, ele era realmente o “vice-presidente” dos Céus, o que estava mais perto do Trono de Deus, o responsável pela Adoração diante do Cria­dor. Era como o “braço direito” de Deus! E tanto destaque ele teve “ao querer ser como Deus” que acabou, no fundo, assustan­do o “Pai da Eternidade”. E Deus o temeu, temeu perder o Trono, a “presidência”. A única coisa a ser feita, enquanto ainda havia tempo, era afastar aquele Querubim tão poderoso. Lançá-lo na Terra! Lucifér é muito poderoso! E o seu exército está aqui para proteger os filhos do Fogo! Os filhos de Lucifér! Muito ao con­trário dos Anjos de Deus, que seguem ordens de Deus, exclusivamente... os anjos do Fogo seguem as ordens dos filhos do Fogo! É possível haver um elo de harmonia com esses seres, pode-se conseguir a amizade dos demônios. Deus se diz amigo dos homens, mas não permite livre acesso destes aos seus Anjos. A Bíblia é bem clara. O contato tem que ser feito “via” Deus, debaixo de permissão, é Deus quem “dá ordens aos seus Anjos” a respeito dos homens. O contato nunca pode acontecer sem antes passar pelo consentimento do Criador. Mas Lucifér permitiu isso, o livre acesso dos seus filhos aos seus subordinados! Ele abriu essa porta, abriu a comunicação direta! É tudo o que precisamos. Porque esses demônios conhecem plenamente ao homem, fazem empatia com o que o homem sonha, com o que o homem anela. O desejo deles é o mesmo desejo do nosso coração: abraçar a liber­dade! Juntos... nós e eles... acrescenta-se “Poder à nossa força”. “E morte aos fracos”!

Aquela frase outra vez.

***

Filhos do Fogo. Filhos do Fogo. Filhos do Fogo.

Aquilo não me saía mais da cabeça.

Mas antes de adiantar qualquer coisa sobre isso, um dia Zórdico começou a falar de outra coisa. Não menos fascinante.

— Há muito Poder nas palavras. Todo o mundo espiritual se movimenta por meio delas... e dos símbolos. Na verdade, a lin­guagem espiritual é simbólica! Esta linguagem é traduzida para nós através do que vamos chamar genericamente de encantamen­to, ou feitiço.

Olhei para Marlon que continuava com os olhos fitos à fren­te, entretido com o que Zórdico falava. Lembrei-me do nosso pri­meiro encontro, quando ele mostrou-me alguns símbolos no car­ro e falou sobre eles. Agora eu começava a entender.

— Os demônios têm Poder de influenciar tudo à nossa volta. Até a Bíblia admite isso! Vejam o caso de Jó: os demônios mata­ram os seus animais e os seus servos. Mataram os seus filhos.

Influenciaram os amigos dele, para dizerem as coisas erradas. In­fluenciaram a mulher de Jó, para dar conselhos fora do propósito de Deus. Deixaram o próprio Jó doente e sem forças para nada. De fato as Entidades podem fazer tudo isso e um pouco mais. Destruir fisicamente, matar, causar doenças, influenciar pessoas, enganá-las, etc. Podem também influenciar o tempo e causar aba­los na natureza, como se vê no mesmo exemplo de Jó! Em suma, o Poder dos demônios é muito amplo, atua em todas as esferas conhecidas: na vida humana e na natureza. Eles podem controlar a vida e a morte! Mas... como manejar esse Poder? Sabemos que nos foi permitido o acesso às Entidades para uma labuta em co­mum! É fácil perceber que aquele a quem for dado esse conheci­mento terá nas mãos um Poder tremendo! Mas esse privilégio — ter ao lado os opositores de Deus — foi reservado para poucos... somente para os filhos de Lucifér.

Na minha cabeça ficava a questão, cada vez mais aguçada: “Quem serão de fato os filhos de Lucifér?!... Esses filhos do Fogo?”

Ainda que eu não tivesse resposta à essa pergunta, compre­endi que o conhecimento acerca das Entidades nos fora dado com um propósito. Obviamente. E o conhecimento dessa verdade, traduzida em símbolos, palavras, encantamentos, feitiços, Ritos... nos levariam a ser detentores daquele Poder incalculável! Zórdico terminou de maneira compacta também: — Para que haja controle dessas forças ocultas que são pró­prias dos demônios é necessário — primeiro — que haja contato com eles! Esse contato que vocês vão ter, a princípio, não será permanente. Será, digamos assim, “experimental”! Porque vejam, não estamos entrando nem de longe no contexto da abertura dos Portais. Lembram-se que falei sobre isso no começo? Que os chakras eram, na verdade, portas de acesso às dimensões parale­las? No entanto, as Entidades estão à nossa volta. Através de Ri­tos simples vamos propiciar um “encontro” para cada um de vocês. Nós já sabíamos, pelo menos teoricamente, como seria pos­sível um contato profundo com os demônios. Através da abertura dos Portais, aquelas “centrais de energia” do nosso corpo. O con­tato permitiria a canalização do Poder deles em nós.

Mas pelo visto as doses homeopáticas continuariam ainda por algum tempo!... Seria mesmo necessário começar com conta­tos “bem leves”.

Sem dúvida ficava até difícil dormir depois dessas revelações...

***

Alguns pequenos encantamentos foram-nos ensinados. Aprendemos algumas palavras específicas em aramaico. Quase cem por cento dos encantamentos são feitos nessa língua. Alguns gestos simbólicos também. E esse foi o início, um vislumbre da periferia da linguagem simbólica espiritual.

Uma vez detentores dessa gota de conhecimento, finalmente Zórdico explicou como deveríamos agir para entrar em contato com os Guias.

Primeiro tomamos contato com a presença deles em aula. Algumas sensações passaram a ser características. Quando eles eram invocados, mediante as palavras de encantamento, algumas alterações se faziam sentir: formigamentos de algumas partes do corpo, adormecimentos de outras, às vezes alguns odores diferen­tes inundavam o ar, ondas de frio, etc. ..

E finalmente... um dia foi passado um “dever de casa”.

Foi uma experiência ímpar mas cujas sensações já estavam sendo plenamente esperadas.

Meu irmão Roberto estava dormindo na casa de minha avó naquela noite. E meus pais haviam ido visitar parentes por causa do aniversário de uma prima. Otavinho tinha ido em companhia deles. De forma que eu estava completamente livre para fazer tudo o que quisesse!

Era uma madrugada de sexta para sábado o dia previamen­te escolhido. Eu deveria iniciar minha experiência à meia-noite. Isto é, sozinho em meu quarto deveria invocar a presença demo­níaca. Seria um momento introspectivo e singular onde eu pode­ria ter contato mais íntimo com o meu Guia. Alguns detalhes permearam aquele pequeno Ritual. Segui todos os passos à risca.

Despi a minha roupa e desenhei um Pentagrama na região infra-umbilical com um ungüento que me havia sido fornecido. A simbologia do Pentagrama havia sido explicada em parte. Fechei os olhos, me concentrei, relaxei usando as técnicas que já tinha praticado tão exaustivamente.

Quando bem relaxado dei início ao pronunciar dos encan­tamentos, fiz os gestos e as sinalizações necessárias, comecei a invocar aqueles que poderiam ser meus amigos.

Foi incrível! Logo comecei a sentir, devagar, as sensações já conhecidas e que denunciavam a aproximação deles. Ondas de frio percorreram o meu corpo, senti-me eriçado. Naquele momento acendi a vela que me tinham dado. Era uma vela esquisita, com uma coloração diferente e que fazia muita fumaça. O ambiente ficou carregado de uma atmosfera bastante peculiar.

Sempre recitando os encantamentos, olhei à frente. Diante de mim estava posicionado um espelho de cristal muito bonito. Ele também tinha sido emprestado para aquele fim. Era do tama­nho de um caderno universitário, com uma moldura de prata ador­nada com inscrições em aramaico. Tanto eu quanto o espelho está­vamos voltados para a posição sul. Fazia parte do procedimento.

E ali como estava, sob a luz da vela, única fonte luminosa, passei a contemplar os meus próprios olhos no espelho. De iní­cio, nada vi além de mim mesmo. Mas depois tive a impressão de que o meu rosto se transformava... assumia características estra­nhas, a musculatura se retesava, os olhos refletiam uma expres­são diferente... não era mais como se fosse o meu rosto! Continuei olhando e subitamente aquela face estranha que parecia sobre­por-se à minha como que “deslizou” até o meu ombro esquerdo.

Então pude de fato contemplá-lo. Estava ali, atrás de mim, e eu via o seu reflexo pelo espelho. A mesma expressão que antes eu vira no meu rosto tinha assumido forma própria. E olhava para mim, através do espelho!

Senti um arrepio grande pelo corpo...! Mas era por causa dele que, muito próximo, retirava um pouco da minha energia de superfície.

Fechei os olhos, estranhamente tranqüilo. Não tive medo. Pela primeira vez acontecia! Dava certo. Falei mais algumas pa­lavras de encantamento, e por fim agradeci a presença dele (em português), disse-lhe que era bem-vindo. E que eu me sentia honrado  uma vez que meu pedido tinha sido atendido.

Quase em questão de segundos deixei de sentir frio. As sensações estranhas desapareceram. Ele se retirara.